terça-feira, 10 de abril de 2012

Nada na areia da ampulheta


No canto esquerdo da sala direita, um sapato dormia depois de uma caminhada longa e perturbada.
As meias estavam amassadas jogadas no mesmo canto e cheirava como o couro desgastado do companheiro.
Pés não havia nenhum nesse lugar tão quieto.
O que havia sem dormir era um pequeno cuco silencioso.
O feitio do móvel que guardava o relógio era de um feito mais velho.
Poucas cadeiras, ardiam sem murmúrio algum que pudesse ser provocado por algum pequeno terremoto.
Um quadro feito de parede era visto apenas pela moldura branca.
Muitos chamariam de buraco, aquilo que era pintura azul caiada com tingidor.
O barulho parecia uma britadeira torta.
Nada se mexia.
Nada rugia, ou murmurava, até que um pelo andou sobre os tacos, revirado pela brisa que vinha cantando pelo pequenino espaço desenhado entre a porta e o assoalho.
A janela fechada com vidro e cortina ouviu tudo isso e aquilo.
Eu não vi nada e nada ouvi.
Senti nada na pele, nem na cartilagem do nariz.
Não tateei um texto e nem tanto.
O que houve é que ao menos alguém leu o pelo que nasceu na escrita.
A sala sempre esteve repleta de palavras e línguas.
Nada, nada - e nascemos na praia.
Essa que o vidro e a cortina esconde